Para o esgoto, só água

Saiba por quê: só deve ir para o esgoto as águas da pia, do tanque e do banheiro

No Brasil, sistema de esgotamento sanitário é diferente do europeu e segue modelo implantado nos Estados Unidos no século 19

Muitas pessoas que já viajaram a outros países, em especial aos da Europa, voltam para o Brasil querendo jogar papel higiênico pelo vaso sanitário. O que muitos não sabem é que não é somente aqui que descartar lixo na rede é inaceitável.

Foi George Waring, em 1879, que criou o sistema de coleta de esgoto, denominado posteriormente de separador absoluto, instalado inicialmente na cidade de Memphis, no estado do Tennessee, e adotado nos Estados Unidos. À época, ao contrário do que se projetava na Europa, o engenheiro sanitarista buscou uma solução para atender à realidade local. A ideia era implantar um serviço de saneamento com obras de menor porte e menor custo. Foi então que ele propôs que o esgoto das casas fosse coletado e transportado em um sistema separado do que era destinado às águas de chuva. O sucesso do projeto foi tamanho que fez com que se espalhasse mundo afora, inclusive no Brasil.

Tubulação menor

O modelo separador absoluto não só não aceita o papel higiênico, como nenhum outro tipo de resíduo sólido. “O que qualquer pessoa precisa saber é que, enquanto as tubulações das galerias de água pluvial são dimensionadas para ter entre 40 e 50 centímetros de diâmetro, as tubulações de esgoto são projetadas para ter 15 centímetros. Por isso, não se pode jogar nada além de esgoto doméstico na rede”, explica o professor do Departamento de Hidráulica e Saneamento da Universidade Federal do Paraná, Miguel Aisse Mansur.

Segundo o professor, as características de países como o Brasil, principalmente com relação ao regime de chuvas – muito acima dos países da Europa – levaram à implantação do sistema separador absoluto. O primeiro sistema de esgoto do Rio de Janeiro, em 1857, foi o modelo unitário, que recebia também águas

pluviais. Mas os ingleses, responsáveis pela implantação, viram-se obrigados a modificar o modelo tradicional devido a uma série de limitações, como o alto índice pluviométrico, a falta de pavimentação nas ruas e a limitação financeira.

O fator econômico é o principal ponto favorável a esse sistema, afinal, utiliza-se tubulação mais barata e de fabricação industrial. Também é mais baixo o custo do afastamento das águas pluviais, que podem ser lançadas no córrego mais próximo sem tratamento. “Nas tubulações de menor porte, as intervenções para manutenção também têm proporções menores”, destaca o engenheiro da Unidade de Serviço de Esgoto (USEG) da Sanepar, Murilo Bertolino. Ele aponta também como vantagens o fato dem as obras poderem ser executadas por etapas e a não obrigatoriedade de ruas pavimentadas para sua implantação.

Desafios

Quem trabalha no serviço de esgotamento sanitário sabe das diversas irregularidades que interferem no rocesso de tratamento. Somente em Curitiba, de um total de 438.501 residências que passaram pela vistoria técnica operacional, cerca de 13.300 ligam inadequadamente a água da chuva ao sistema de esgoto. Se forem considerados outros fatores, aumenta o número de irregularidades. Falta caixa de gordura, por exemplo, em 26.984 imóveis.

Quando recebemos a chave de uma casa, a primeira coisa que verificamos é onde estão a caixa de energia e o registro de água. Ninguém se interessa em saber para onde vai o esgoto. Devíamos mudar isso. O esgoto é tão importante quanto os outros serviços. O principal desafio é avançar na educação, na consciência ambiental que passa por nos preocuparmos para onde vão todos os resíduos que geramos”, comenta o professor Mansur.

Compartilhar responsabilidades

Agir e se comportar como cidadão moderno faz com que as responsabilidades sejam compartilhadas. No serviço de coleta e tratamento de esgoto, a perspectiva não é diferente. “O que a gente precisa – desde o usuário até os projetistas e executores dos sistemas de esgoto – é olhar com mais atenção a operação desse sistema tão complexo. Estamos falando de ligações prediais, redes coletoras, estações elevatórias, de tratamento, retirada, secagem e reciclagem do lodo, destinação do lixo que vem com a coleta, até chegar ao efluente tratado. Somos todos responsáveis”, alerta o engenheiro sanitarista e gerente da Unidade do Processo Esgoto (USES) da Sanepar, Edgard Faust Filho.